sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Cimeira UE/África: Um diálogo cheio de vírgulas entre dois continentes

O Presidente líbio Muammar Kadhafi, de quem se diz ser uma pessoa imprevisível, chegou afinal a Lisboa à hora prevista. Foi centro de atenções durante o dia de ontem, antes da chegada, à noite, de Robert Mugabe, do Zimbabwe, ou da chegada, prevista para esta tarde, de José Eduardo dos Santos, de Angola.

Hoje, cerca de 80 chefes de Estado e de Governo de África e da União Europeia (UE) serão recebidos a partir das 18 horas no Pavilhão de Portugal (Parque das Nações em Lisboa) pelo presidente em exercício da UE, José Sócrates.

O primeiro-ministro quer deixar uma marca de Portugal na política externa dos Vinte e Sete. A presidência portuguesa aposta na ideia de que é "o país mais africano" da Europa. E insiste num relançamento inadiável do diálogo entre os dois continentes, sete anos após a cimeira do Cairo.

Depois de receber os líderes, Sócrates será o anfitrião de uma recepção no Pavilhão de Portugal. Mais tarde, no Palácio da Ajuda, o Presidente Cavaco Silva oferece um banquete. À noite, um concerto no Pavilhão Atlântico, também em Lisboa, junta dois símbolos da música dos dois continentes - a portuguesa Mariza e a cabo-verdiana Cesária Évora - numa abertura simbólica da cimeira que amanhã inicia os seus trabalhos.

Entre os oradores que falarão sábado de manhã estão Angela Merkel e Nicolas Sarkozy. A chanceler alemã abordará a governação e os direitos humanos; o Presidente francês a paz e a segurança.

Protestos nas ruas

Nunca em Portugal estiveram tantos líderes internacionais juntos. E nunca tantos contestados de forma tão virulenta. Além de Mugabe e Kadhafi, estarão em Lisboa Meles Zenawi, da Etiópia, Omar al-Bashir, do Sudão, e outros que não deixam indiferentes organizações de direitos humanos e as sociedades civis dos dois continentes. Estão previstos protestos e acções de rua nas quais serão "julgados" líderes europeus, como o comissário europeu para o Comércio, Peter Mandelson, numa iniciativa contra as políticas que afectam o comércio e a agricultura em África e os pequenos agricultores na Europa.

Na cimeira, os acordos esperados para o comércio serão previsivelmente os mais difíceis perante resistências africanas de uma abertura maior dos seus mercados. O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, já anunciou uma ajuda de dois mil milhões de euros por ano, a partir de 2010, para reforçar a capacidade dos países africanos. Outras ajudas pontuais para essa área foram anunciadas nesta cimeira, que quer marcar uma ruptura com a relação de doador-receptor de ajuda entre Europa e África.

Outras divergências são esperadas sobre a forma a dar ao capítulo da governação e direitos humanos e se este se deve centrar no Zimbabwe. Mas também sobre outro dos pilares da nova parceria estratégica "entre iguais" que aqui nascerá entre UE e União Africana: paz e segurança.

Poderão, neste painel, líderes europeus e alguns do continente africano falar firmemente com Bashir sobre formas de pôr fim ao conflito no Darfur? As expectativas das sociedades civis são quase nulas. A partir de hoje também vão acontecer em Lisboa conferências de imprensa de advogados de direitos humanos ou activistas presos arbitrariamente no Chade, na Etiópia, na Eritreia ou no Zimbabwe. Amanhã, no Hotel Tivoli Jardim, haverá um protesto direccionado contra o Presidente Mugabe. Em Lisboa está um grupo de jovens do país e organizações de direitos humanos para contestar a sua presença. Esta acção também visa Bashir, responsabilizado pela violência no Darfur.

A presidência garante que estes temas não serão esquecidos, mas que o propósito da cimeira é uma aproximação global. E que só esta poderá estabelecer as bases para que países da UE e da UA possam dialogar também sobre essas matérias.

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